CEBs: que são? Donde vêm?
Este pequeno e modesto roteiro, preparado por nossa Arquidiocese, tem a finalidade de esclarecer em linguagem mais clara, breve e popular o que são e de onde vêm as CEBs. Esperamos que ele possa oferecer algumas pistas que nos ajudem a compreender melhor, para viver este velho/novo modo de ser Igreja.
Pra começo de conversa: As CEBs (Comunidades Eclesiais de Base) nasceram há dois mil anos atrás com uma Boa Notícia que reacendia em todos os corações a chama da esperança: JESUS RESSUSCITOU!
Foi a partir desta “notícia quente” e verdadeira que os seguidores e seguidoras de Jesus se uniram e reuniram em pequenas comunidades para testemunhar que só o Amor pode vencer o poder do mal e a Vida é mais forte que a morte.
Por isso,
“Eram perseverantes em ouvir o ensinamento dos apóstolos, na comunhão fraterna, no partir do pão e nas orações” (At 2,42).
“Ninguém considerava propriedade particular as coisas que possuía, mas tudo era posto em comum entre eles” (At 4,32b).
Este modo de viver, conviver, conhecer, acolher, partilhar, logo empolgou muita gente que começou a abrir as portas de suas casas para reunir, aí, as pessoas que queriam permanecer fiéis a Jesus e a seu projeto.
Em todo o Novo Testamento, a CASA aparece como espaço importante de encontro da família e da comunidade-Igreja, de realização das pessoas e de defesa da vida. Confira, por exemplo, a relação de Jesus e seus discípulos com a casa:
No Evangelho segundo Mateus 8,14; 9,10.23.28; 13,1.36; 17,25; 26, 6.18;
em Marcos 2,2; 3, 20; 7,17.24; 9,28.33; 10,10; 14,3;
em Lucas 7,36.44; 8,41; 10,38; 11,37; 14,1; 19,5b.7.9;
em João 1,11; 11,15.19; 12,3.
Em Atos dos Apóstolos, vamos encontrar casas acolhedoras, a serviço da evangelização, como é
a casa de Judas (9,11);
a casa de Tabita (9,36ss);
a casa de Cornélio (10,1ss);
a casa de Maria, mãe de João Marcos (12,12ss);
a casa de Lídia (16,14ss.40);
a casa de Priscila e Áquila (18,1ss)...
Também o apóstolo Paulo, fundador de muitas comunidades e hóspede de tantas casas que o acolheram ao longo de suas viagens missionárias, recordará com alegria a acolhida recebida nas igrejas reunidas nas casas:
“Saudações a Prisca e Áquila...Saúdem também a igreja que se reúne na casa deles” (Carta aos Romanos 16, 3.5; cf. 1ª Carta aos Coríntios 16,19).
“Saúdem os irmãos de Laodicéia, como também Ninfas e a igreja que se reúne na casa dele” (Carta aos Colossenses 4,15).
“Paulo, prisioneiro de Jesus Cristo...à igreja que se reúne na casa de Filemon” (Carta a Filemon 1,1.2)...
A casa é assim, para as primeiras comunidades cristãs, o lugar de encontro, aberta aos vizinhos, amigos, irmãos, onde todos procuram conhecer-se mais e melhor, dividir os problemas e dificuldades à luz da Palavra, para encontrar caminhos que ajudem a transformar o sonho do reino de Deus em realidade vivida por todos.
Por isso, a casa será lugar de abastecimento da fé, onde todos renovam e revigoram suas forças e energias, para cumprir, no mundo, o mandato de Jesus: “Vão pelo mundo inteiro e anunciem a Boa Notícia!” (Mc 16,15)
Aqui também é bonito como estes nossos irmãos logo compreenderam que a missão é dinâmica, “para fora”, “aberta ao mundo!”.
“Vocês são o sal da terra!” “Vocês são a luz do mundo!” (Mt 5,13-16)
E logo foram se envolvendo com os grandes desafios sociais, econômicos, políticos, culturais, religiosos etc., misturando-se em todas as situações e realidades, para fermentar a massa com o fermento bom e transformador do Evangelho (cf. Mt 13,33).
Problemas não faltaram e, todos eles, muito parecidos com os nossos. Conflitos internos que provocavam divisão e desunião no seio das próprias comunidades com incompreensões, calúnias, ciúmes, inveja, intrigas, disputa de poder, preconceitos etc. E os conflitos externos, marcados sobretudo pela perseguição do império romano que condenava na ação dos cristãos o projeto de Jesus de uma sociedade justa, fraterna e igualitária.
Esta época do cristianismo foi bem descrita pelo livro do Apocalipse que é a síntese da vida dos cristãos perseguidos, refugiados (Igreja das catacumbas), obrigados a esconder-se e a modificar até a própria fala e usar de linguagem figurada por terem escolhido fazer o mesmo caminho de Jesus, na consciência de que “é preciso obedecer antes a Deus do que aos homens” (At 5,29).
Muita atenção: Com o passar do tempo, sobretudo a partir do século IV depois de Cristo, com o imperador Constantino, esta Igreja que antes se reunia nas casas ou mesmo nas catacumbas para escapar à perseguição do império romano, cede lugar agora à Igreja massificada, dos grandes templos e das liturgias pomposas, mais afastada da vida e da realidade do povo e mais ligada ao poder e ao luxo do império. Um tempo de “escuridão”, de muitas dificuldades e problemas, de traição do projeto original de Jesus por parte de muitos que se diziam seus seguidores. Mas é também tempo de vozes santas, proféticas e fiéis: irmãs e irmãos que como São Francisco de Assis, Santa Clara, Santo Antônio e tantos outros, se sentem chamados a reconstruir a Igreja dos pobres e com os pobres. Este período irá até o século XX, com a convocação, do Papa João XXIII, para o Concílio Ecumênico Vaticano II (1962-1965).
Quando convocou o Concílio, o Papa João trazia consigo uma preocupação fundamentalmente missionária: na realidade do pós-guerra, começava a crescer, no mundo, a miséria e a fome e, por isso mesmo, a Igreja que estava afastada de sua missão, devia retomar a fidelidade ao Evangelho que é Boa Nova (notícia alegre) que liberta e traz vida nova e plena para todos (cf. Jo 10,10). É neste contexto que João XXIII diz:
“A Igreja está com cheiro de mofo. Precisamos abrir suas portas e janelas para que ela entre de ar novo no mundo”.
Com esta motivação cheia de dinamismo e esperança, o Papa abria caminho para realizar aquilo que seria o principal objetivo do Concílio: fazer com que a Igreja retornasse às suas origens na fidelidade ao projeto de Jesus, assumindo sua missão de evangelizar o mundo, no compromisso de construir o Reino de Deus com os pobres e excluídos (cf. Lc 6,20-26), para “que todos tenham vida”.
É aqui que renascem as CEBs (aquelas que deixamos lá nos primeiros séculos do cristianismo) –novo/velho modo de ser Igreja–, como resposta ao sonho do Papa João e aos ideais do Concílio.
Como foi este renascimento? Muito bonito! Todo o Povo de Deus –leigos e pastores– assumindo com renovados ardor e amor a missão de ser sal, fermento e luz. rupos de pessoas simples do povo como trabalhadores, camponeses, domésticas, desempregados etc. que voltam a se reunir para pensar juntos a sua realidade à luz da Palavra de Deus e encontrar caminhos de superação da miséria, da fome e da exclusão, na defesa de melhores condições de vida e dignidade para todos, para “que todos tenham vida”.
Por isso, mais tarde, os Bispos latino-americanos reunidos em Puebla (1979), dirão que as CEBs “converteram-se em centros de evangelização e em motores de libertação e desenvolvimento” (nº 96). E os Bispos do Brasil, no documento 25, lembram que “no constante esforço de atuar, refletir e celebrar, as CEBs são uma alternativa de educação para os que buscam uma sociedade nova, onde o individualismo, a competição e o lucro cedem lugar à justiça e à fraternidade” (nº 40).
E hoje, como vão as CEBs? Com certeza mais vivas do que nunca em todos aqueles e aquelas que permanecem fiéis a Jesus e a seu Projeto, ao reino de Deus e à vida dos Pobres.
É natural que para manter viva e eficaz esta fidelidade, as CEBs, da mesma maneira que o Evangelho, devem inculturar-se, isto é, penetrar as diversas culturas, situações e realidades para comunicar aí a Boa Nova sem, contudo, perder sua identidade original que é fidelidade a Jesus, a seu caminho e ao seu projeto.
Para o mundo que vive no individualismo, no egoísmo, na acumulação que determina que o dinheiro e o mercado são mais importantes que a pessoa e na indiferença diante do drama dos miseráveis e famintos, as CEBs serão sempre a ALTERNATIVA que, ao abrir as portas das casas para que aí se possa fazer e ser Igreja, aponta, com esperança, perseverança e teimosia para o “outro mundo possível”.
CEBs: Igreja do passado, do presente e do futuro: Porque são obra de Deus e do seu Espírito que atua na história, as CEBs continuam fazendo caminho hoje em todos aqueles irmãos e irmãs, famílias, grupos ou comunidades que mantêm viva a “espiritualidade libertadora” e o empenho de “seguir Jesus no compromisso com os excluídos”. Muitos são os traços que fazem o rosto das CEBs no novo milênio. Entre eles destacamos três que consideramos muito importantes:
1. As CEBs são comunidades missionárias e ecumênicas, isto é, abertas ao mundo, ao diferente, aos pobres e excluídos, às diversas culturas e religiões e até mesmo aos que não têm fé, mas trabalham e lutam pela justiça. Na libertação de todo preconceito e discriminação, estarão sempre dispostas ao diálogo, na busca de novos caminhos que superem as enormes barreiras e contradições sociais, para construir o Reino de Deus na solidariedade, na justiça, no amor e na paz.
2. As CEBs devem ser hospitaleiras, abrindo todas as portas e janelas para “entrar de ar novo no mundo”, testemunhando para todos, mas muito especialmente para os pobres e excluídos, a alegria da acolhida, da amizade, da fraternidade, da comunhão e do envolvimento de TODOS, para a grande festa da inclusão.
3. A exemplo de Jesus, o Filho de Deus e nosso Irmão Maior, que não veio para ser servido, mas para servir, as CEBs serão servidoras. Aqui, dois ensinamentos concretos ajudam a compreender a verdadeira essência das CEBs:
- Pe. Picoli lembra o sal que, enquanto está no saquinho, pode ser visto por todos e parece até bonito, brilha! Quando, no entanto, se mistura à comida, desaparece. Não podemos mais vê-lo, mas é justamente quando está cumprindo a sua missão de dar sabor, salgar, temperar. As CEBs são o sal ou o fermento que, misturadas na massa, desaparecem, mas é aí que estão realizando sua missão de transformar o velho mundo egoísta e individualista no mundo novo da partilha e da solidariedade.
- Dom Eurico usa uma imagem parecida ao falar da estrutura de um prédio que, na verdade, é o que sustenta todo o edifício, embora não possa ser vista. Assim também as CEBs, enquanto estrutura de Igreja, são as humildes e fiéis servidoras da humanidade peregrina, sustentando, dando suporte, fortalecendo e animando a vida e a missão de toda a Igreja, chamada a ser sal, fermento e luz.
Para conversar:
Você já conhecia esta história das CEBs? Que outros dados você acrescentaria a ela?
Quais as principais dificuldades encontradas pelas CEBs (velho/novo modo de ser Igreja) no mundo moderno? É possível superá-las? Como?
Quais os passos que podem e devem ser dados para que as CEBs possam se adaptar (inculturar) aos novos tempos?
Você participa de alguma comunidade ou grupo que pode ser considerado uma CEB? Conte como funciona.
No mundo individualista em que vivemos, que significa abrir as portas de nossas casas para nelas fazer e ser Igreja?
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